Por unanimidade, a 10ª turma da corte concedeu habeas corpus a indígena da etnia Enawene-Nawe, réu em ação penal por receptação, em tramitação no Estado de Rondônia. A pedido da defensoria pública da união, o tribunal determinou a anulação da citação do acusado via WhatsApp, e sua citação pessoal por oficial de justiça acompanhado de intérprete para traduzir as imputações para o seu dialeto tribal.
Devido à ausência do intérprete, o desembargador Federal Marcus Vinicius Reis Bastos, relator do caso, sustentou que “não é crível supor, por conseguinte, que tenha tomado regular conhecimento dos termos da acusação contida em peça subscrita por profissional do Direito, com o uso de linguagem própria, a qual lhe fora encaminhada em arquivo formato .pdf, via aplicativo de mensagens WhatsApp, ausente tradução para a sua língua materna.”
Porém, segundo o nosso Código de Processo Civil (também aplicável, em caráter subsidiário, a assuntos criminais), intérpretes só devem ser nomeados pelo juiz para a tradução de documentos em idioma estrangeiro, para partes e testemunhas que não conheçam a nossa língua, ou para a interpretação de partes e testemunhas que apresentem deficiência auditiva. Ora, antes de ser indígena, o acusado é brasileiro, e magistrados não devem supor que cidadãos nascidos e criados em nosso território desconheçam o nosso idioma, no qual se desenrolam todos os processos judiciais aqui. É surpreendente ver togados se referirem a outra “língua materna” de brasileiros (como o acusado) que não o português.
Observamos, assim, uma procrastinação indevida de assuntos criminais, que deveriam tramitar de modo ágil e eficiente, para maior prejuízo da sociedade, lançada à insegurança de não saber de fato quem praticou o delito em questão, e, se for o caso, qual será a sanção imposta ao eventual infrator.
Leia a íntegra da decisão:
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2024/2/828986B01C55DD_%C2%B7JusticaFederalda1%C2%AARegiao.pdf
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