STF: Estado deve indenizar família de vítima de bala perdida, mesmo sem perícia conclusiva

No caso em discussão, Vanderlei Conceição de Albuquerque foi atingido por projétil de arma de fogo dentro de casa, na comunidade de Manguinhos, no RJ, durante tiroteio entre moradores, militares do Exército e policiais militares. Após seu óbito, a família moveu ação contra a União e o Estado, mas o juízo de primeira instância rejeitou os pedidos de indenização por danos morais, ressarcimento das despesas do funeral e pensão vitalícia, pois a perícia não havia conseguido determinar a origem do disparo. Em grau de recurso, o TRF-2 manteve a decisão, tendo entendido que “não havia dados que vinculem o ocorrido à atuação dos militares da Força de Pacificação do Exército na comunidade, pois o laudo pericial foi inconclusivo quanto à origem do projétil.”

Os familiares levaram o assunto ao STF, perante o qual sustentaram uma suposta desnecessidade de discussão sobre a origem da bala, diante da responsabilidade objetiva do Estado por danos causados por seus agentes a terceiros. No Supremo, o pedido da família foi acolhido, embora tenha ensejado as seguintes quatro correntes de entendimento:

1 – Posição do ministro Edson Fachin (relator): concessão de R$ 300 mil de indenização, sendo R$ 200 mil para os pais e R$ 100 mil para o irmão, além de ressarcimento dos gastos com funeral e pensão vitalícia. Para Fachin, “sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública.” O voto foi acompanhado pelos ministros Gilmar Mendes, Carmen Lúcia e Rosa Weber (ora aposentada, mas que já havia votado).

2 – Posição do ministro André Mendonça: “o Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública. Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos.”

No caso, Mendonça votou pela condenação apenas da União, pois a PM/RJ não havia participado daquela operação específica. Mendonça foi seguido pelos ministros Dias Toffoli e Nunes Marques.

3 – Posição do ministro Alexandre de Moraes: “A responsabilidade estatal por morte de vítima, por disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, pressupõe a comprovação de que o projétil partiu dos agentes do Estado.” A postura, acompanhada apenas pelo ministro Luís Fux, foi vencida no tribunal.

4 – Posição do ministro Cristiano Zanin: “a perícia inconclusiva sobre a origem de disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado.” Zanin foi acompanhado pelo ministro Barroso.

Apesar das “variantes”, prevaleceu na corte o entendimento de que o Estado deve indenizar vítimas de tiroteios, até mesmo nos casos em que os peritos sejam incapazes de atestar o disparo do projétil por agentes de segurança. O ente estatal possui responsabilidade objetiva (independente de prova de culpa) pelas condutas de seus funcionários, razão pela qual tem de indenizar as vítimas, sempre que estas tiverem sido indevidamente alvejadas por agentes públicos. Porém, responsabilizar o Estado por disparo que possa ter sido proveniente da arma de um bandido é imoral, além de contrário aos princípios básicos da responsabilidade civil.

Na prática, “graças” a essa decisão, os Estados (por suas PMs) e a União (pelas forças armadas) pensarão várias vezes antes de exercer sua atribuição institucional de confrontar a criminalidade grossa e proteger nossas fronteiras contra meliantes. Afinal, a partir desse julgado supremo, o cumprimento do dever de ofício poderá acarretar passivos estratosféricos para os entes públicos. E, como sempre, sairá perdendo a coletividade, exposta ao atual apagão na segurança pública.

Processo: ARE 1.385.315

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