Em exame de ação proposta pelo Psol, o ministro Cristiano Zanin determinou, em caráter liminar, a suspensão de todos os decretos municipais do Estado de Santa Catarina que dispensavam a apresentação da certidão de vacinação contra Covid-19 por ocasião da matrícula de alunos nas redes pública e/ou privada de ensino.
Acatando todos os argumentos da sigla esquerdista, o togado entendeu que o assunto deveria ser examinado com urgência, pois, com o início do ano letivo, “já se verifica a lesão a direito fundamental de crianças e adolescentes, caso estejam expostas a ambiente de insegurança sanitária.” Após ter destacado o que designou como “papel importante” supostamente desempenhado pelo STF no enfrentamento da pandemia de Covid-19, invocou o Estatuto da Criança e do Adolescente para afirmar que “o direito assegurado a todos os brasileiros e brasileiras de conviver num ambiente sanitariamente seguro sobrepõe-se a eventuais pretensões individuais de não se vacinar.” E concluiu afirmando que “uma vez incluída no Plano Nacional de Imunização, não pode o poder público municipal normatizar no sentido de sua não obrigatoriedade, sob pena de desrespeito à distribuição de competências legislativas.”
Porém, se, por um lado, a Constituição assegura os direitos à vida e à saúde, inclusive de crianças e adolescentes, por outro, a mesma CF contempla o direito à livre consciência e princípio da legalidade estrita, segundo o qual ninguém pode ser obrigado a fazer, ou a deixar de fazer algo senão em virtude de lei. Ao falar em “lei”, o texto constitucional não se refere a qualquer orientação do ministério da saúde (órgão do poder executivo), mas a norma debatida e aprovada no congresso nacional, e sancionada pelo presidente da república. Assim, chega a ser curioso ler a decisão de Zanin baseada em pretensa “distribuição de competências legislativas”, quando a obrigatoriedade da aplicação da vacina contra Covid-19 jamais foi matéria “legislada”, tendo sido apenas objeto de recomendação pelas autoridades competentes.
Sequer caberia ao togado aludir à Lei 13979/2020 sobre medidas para enfrentamento da emergência em saúde pública, pois: (i) a referida norma não classificou a vacinação como “obrigatória”, mas apenas medida passível de ser adotada pelas autoridades, e (ii) “o quadro fático e sanitário atual (em relação à Covid-19) encontra-se estabilizado”, segundo afirmação do próprio Zanin na ação ADPF 754, que ele encerrou sem qualquer responsabilização do então presidente Bolsonaro.
O magistrado tampouco poderia ter se ancorado em julgado antigo (datado de 21, ainda sob o impacto da pandemia), de relatoria de seu colega Barroso, segundo o qual “é constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária.” Afinal, falar de uma “obrigatoriedade” não prevista em lei é puro sofisma. E afirmar que “não podem decretos municipais disporem em sentido absolutamente contrário ao que já foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de afronta direta ao Texto Constitucional” é equiparar o STF ao próprio teor da Constituição que lhe cabe interpretar, em uma extrapolação inadmissível.
Assim, infundada a canetada monocrática do magistrado, de índole autoritária, e desrespeitosa para com a autonomia gerencial de cada um dos municípios alvejados. A decisão ainda se mostra extemporânea – já que o “encerramento” do período pandêmico foi declarado pela própria OMS -, e servil às determinações do Planalto, que adotou a vacinação infantil contra Covid-19 como uma de suas novas “fixações”. Nada surpreendente em se tratando de juiz supremo que, até pouquíssimo tempo atrás, atuava como advogado do presidente.
Leia a íntegra da decisão do ministro Zanin:
https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2024/02/ADPF-1123.pdf
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1 Comment
Surreal isso.
Poxa, se não pode ajudar, não atrapalha.
Esses ministros acham que estão acima do bem e do mal e tomam decisões sem razão, sem nexo.
Ministro, não atrapalha vai