Na tarde desta quarta-feira (3), o desembargador José Rodrigo Sade, do TRE/PR, acolheu, em parte, as ações eleitorais propostas pelo PL e pela Federação Brasil Esperança (encabeçada pelo PT), para determinar a cassação do senador Sérgio Moro (União/PR), assim como para deixá-lo inelegível por 8 anos e para autorizar a convocação de novas eleições para sua cadeira no senado. Sade é o mais novo integrante da corte eleitoral paranaense, tendo sido nomeado por Lula no início deste ano, com o apoio do coletivo de advogados esquerdistas Prerrogativas.
Em seu voto de quase uma hora e meia, o togado usou os primeiros vinte minutos como preâmbulo para afirmar, na mesma linha do relator do caso, que o litígio não diz respeito à atuação de Moro à frente da Lava-Jato, consistindo, antes, em um “VAR” da eleição, em analogia ao vocabulário futebolístico. Teceu um breve histórico da vida pública de Moro e de sua entrada na política mediante o ingresso no quadro de ministros de Bolsonaro, em posição adequada ao combate à corrupção e à criminalidade, o que “não é função de magistrados”, na opinião de Sade.
Em relação ao suposto abuso de poder econômico (principal acusação contra Moro), admitiu a ausência de parâmetros normativos para a definição desse tipo de desvio. “Considerando que a legislação eleitoral não traz parâmetros para a caracterização desse tipo de abuso, penso oportuno estabelecer algumas premissas para a avaliação”, afirmou o magistrado.
Sua primeira premissa consistiu na pretensa desproporção entre as campanhas presidencial e para o senado. De acordo com o togado, Moro teria protagonizado uma “inusitada situação”, o que teria influenciado a alocação, em sua pré-campanha, de recursos bem superiores aos disponibilizados em benefício dos demais participantes da disputa. Ainda nesse item, Sade entendeu ser possível a configuração de um abuso, ainda que inexistente uma nítida violação aos dispositivos legais. Em suas palavras, “não se pode excluir a possibilidade de existir um abuso de poder econômico sem a existência de uma clara infração às normas eleitorais.”
Em seguida, passou à análise da notoriedade do ex-juiz. Para Sade, “não se nega que o investigado Moro tinha capital político admirável. (…) Porém, se essa fama bastasse, não faria sentido a alocação de recursos vultosos, bastando aguardar as eleições”. O togado enfatizou, ainda, que “não é necessário que a fama angariada como magistrado se transforme automaticamente em voto, tendo sido necessários altos investimentos em comunicação. (…) Se fama de magistrado fosse suficiente para torná-lo bom de voto, há que se perguntar o porquê do ministro aposentado, Joaquim Barbosa, que se popularizou como relator do mensalão, não ter saído candidato.”
Por fim, o magistrado aludiu à cassação do mandato de senadora da ex-juíza Selma Arruda, tanto pelo tribunal local quanto pelo TSE, como precedente relevante para a adoção de sua postura no caso envolvendo Moro.
Não é razoável acreditar em uma completa isenção de Sade. Afinal, trata-se de togado nomeado há poucos meses por Lula, político condenado por Moro e, desde então, desafeto ostensivo de seu sentenciante, ora em julgamento. Assim, em países um pouco mais avançados que o nosso, qualquer magistrado na posição de Sade teria optado por manter-se afastado desse processo.
Já a mencionada “desproporção” entre as dimensões de campanhas ao Planalto e ao senado foi indevidamente usada, tanto pelas siglas autoras das ações quanto por Sade, como uma vedação a mudanças de planos por parte de candidatos. O descabimento do argumento reside na inexistência de leis que proíbam a revisão de planos políticos por parte de pré-candidatos a cargos de maior responsabilidade institucional. Como não há interdição legal a essa espécie de downgrade, e como, segundo a Constituição, indivíduos só podem ser obrigados a fazer, ou a deixar de fazer algo em virtude de lei, não cabe a um togado retirar legitimidade de uma candidatura plenamente viável à luz da legislação.
Em relação ao pretenso “abuso”, também foi inusitado o teor do voto de Sade, ao ter criado a figura da conduta abusiva que dispensa a demonstração de clara violação à lei, e/ou da intenção de extrapolar algum direito. Se, de acordo com o Código Civil, atos ilícitos consistem na violação a direito que cause danos a outrem, ou no exercício de direitos em extrapolação aos limites da boa fé e dos costumes, e se, de acordo com o próprio togado, Moro nem violou a lei nem foi responsável por uma comprovada extrapolação, em que exatamente teria residido o tal “abuso”?
Já as especulações de Sade sobre o reconhecimento prévio de Moro (e a influência deste sobre o seu dito “capital” eleitoral) não passaram de curiosos malabarismos retóricos. Em suas retorsões, o magistrado fingiu não compreender a irrelevância dos tópicos por ele suscitados. Longe das apostas opinativas em torno da notoriedade de um ex-juiz, ou dos critérios empregados pelo partido na alocação de verbas em sua pré-campanha, o que estava em jogo era o exame de uma alegada ilicitude na candidatura de Moro. Ilicitude que, por todas as razões acima, não foi comprovada, nem pelas siglas indignadas nem por Sade.
O julgamento tornou a ser suspenso, e deverá ser retomado na próxima segunda-feira (8). No aguardo.
Fonte: canal do TRE/PR no Youtube



